terça-feira, 19 de abril de 2016

O caminho estreito para os confins do norte

Design por Bloco Gráfico



O caminho estreito para os confins do norte
Autor: Richard Flanagan
Designer: Bloco Gráfico
Editora: Globo (Biblioteca Azul)
Fonte: Estilo
Acabamento: pantone metálico e cores especiais.

Aclamado com o Man Booker Prize em 2014, O caminho estreito para os confins do norte, de Richard Flanagan, foi lançado no Brasil pela Biblioteca Azul, selo da Editora Globo. O romance narra a história de Dorrigo Evans, um jovem que vai para Melbourne estudar medicina e se alista no exército. Capturado pelo exército japonês, é obrigado a trabalhar na construção da Estrada de ferro de Thai-Bhurma, também conhecida como a Ferrovia da Morte. Misturando elementos históricos e de ficção. O relato da guerra é inspirado na vida do pai do autor, um dos sobreviventes dos trabalhos forçados na “Linha”. Idealizada pelo Império japonês para dar suporte às tropas na campanha da Birmânia, a ferrovia tem 415 km de extensão e mais de 14 mil homens morreram durante a construção.

A capa aberta (clique para ampliar)
Sobre a proposta estética que a editora queria para o livro, o editor Estevão Azevedo comenta que a idéia era evitar o uso de fotografias, que nesse período histórico eram muito terríveis e de má qualidade, e o livro, apesar de ambientado na guerra, contém também uma história de amor. Uma das referências apontadas foram as capas estrangeiras, que se utilizam da figura de uma peônia que está na epígrafe do livro, um haikai do poeta japonês Bashô, de onde saiu o título. Ao longo do processo de desenvolvimento do livro, descobriu-se que um dos personagens, um soldado australiano que escondido faz desenhos do campo de prisioneiros, existiu. Então buscou-se seus desenhos para ajudar na composição da capa.

A criação da capa ficou a cargo do estúdio de design Bloco Gráfico, formado pelos designers Gabriela Castro, Gustavo Marchetti e Paulo André Chagas. Abaixo, Gustavo Marchetti responde a uma rápida entrevista sobre o processo criativo da capa, com as várias versões criadas até chegar ao resultado final, e fala um pouco sobre o estúdio.

O livro funde uma história de guerra com uma história de amor. Que caminhos vocês buscaram seguir e que caminhos tentaram evitar, para dar à capa sua própria personalidade?
Fazer esse projeto foi algo muito instigante para nós, principalmente pelo rico diálogo com Estevão Azevedo, o editor. Em nossa primeira reunião, ele nos contou um pouco do romance, nos deu alguns caminhos: não usar fotos de guerra, pois poderiam ficar muito fortes e o livro não era apenas sobre isso; ele também citou uma inspiração: as capas dos livros do Bashô de mesmo título. O desafio dessa capa era justamente esse: a convivência do tema da guerra com uma história de amor e também o envelhecimento do protagonista.

Primeiras opções: linhas geométricas (clique para ampliar)
Além disso, esse livro foi lançado com um outro do mesmo autor (O livro de peixes de Gould) e a ideia era estabelecer uma identidade entre eles, que fossem identificados como do mesmo autor, mas mantendo a individualidade de cada um. Foi um longo processo até chegarmos à versão final. Começamos com capas bem geométricas, que enfatizavam a ideia do caminho e o trilho do trem e tinham como referência padronagens orientais, mas que deixavam um pouco de lado a relação entre amor e guerra. Depois, utilizamos imagens de uma enciclopédia iconográfica de gravuras do final do século XIX, mas as capas continuavam muito sóbrias e até com um ar um pouco acadêmico.

Novas variações: contraposições (clique para ampliar)
Nossa ideia então foi explorar o uso de camadas para contemplar essa sobreposição de narrativas. As ilustrações utilizadas no “O caminho estreito…” são desenhos de guerra com anotações, como um diário, encontrados no Australian War Memorial, de um prisioneiro de guerra real da história que é ficcionalizada no livro. em contraposição a alguns desenhos de botânica também da época. Utilizamos o mesmo procedimento de sobreposição também no O livro de peixes… (com os desenhos de William Gould).

A diferenciação entre os dois se dá também através das cores, que foram escolhidas com o intuito de tirar um pouco a cara de “capa de época” dos livros. No caso do O caminho estreito… optamos pelo contraste do cobre com um rosa bem vivo. Ficamos muito satisfeitos com o resultado final.

Há um livro do poeta japonês Bashô que compartilha do mesmo título, isso influenciou no processo do design, numa aproximação ou num distanciamento com as capas das edições estrangeiras dele?
Como contamos um pouco acima, um elemento forte dos primeiros estudos era a influência da arte japonesa (até porque o livro faz menção explícita ao poeta), contudo mais ligada às padronagens abstratas, talvez mais relacionadas aos livros japoneses (mais que a arte em si). Mas optamos pelo caminho dos desenhos sobrepostos, achamos mais interessante para o romance.


Qual a fonte escolhida, e o que os levou a escolher essa fonte?
A fonte é a Estilo, do português Dino dos Santos. A ideia era usar uma fonte que tivesse uma grande variedade de desenhos das mesmas letras e muitas ligaturas, pois a utilizaríamos nos dois livros do autor. A ideia era que ela se adaptasse à cada livro, dando personalidade aos títulos, mas que fosse bem geométrica, para se destacar do fundo com a sobreposição dos desenhos, e que, ainda assim, fosse identificada como família (mas mais pelo princípio construtivo do que por variações de peso, por exemplo).

Que acabamentos especiais foram usados na capa? Eles trouxeram alguma dificuldade a ser contornada na produção gráfica do livro?
Utilizamos duas cores especiais, além do preto, e fizemos testes para nos certificarmos que o pantone metálico não daria rejeição sobre as outras tintas.

Como surgiu o Bloco Gráfico, e qual a proposta do estúdio?
Nós três trabalhamos juntos na editora Cosac Naify por muitos anos e, em um certo momento, projetos em outras áreas começaram a surgir, então decidimos nos unir, e essa demanda foi crescendo ao longo do tempo. A proposta do estúdio é atuar em diversos campos do design, tanto no editorial quanto em projetos de identidade visual e expográficos.

Bloco Gráfico é um estúdio de design fundado em 2011 por Gabriela Castro, Gustavo Marchetti e Paulo André Chagas. Desenvolve projetos para clientes como Instituto Moreira Salles, Cosac Naify, Biblioteca Azul, Editora Nós, Sesc, entre outros. Teve trabalhos premiados nas 10ª e 11ª bienais de design gráfico da ADG, Prêmio Aloísio Magalhães da Fundação Biblioteca Nacional de melhor projeto gráfico de livro e o Premio Latinoamericano al Diseño Editorial.

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